domingo, 5 de julho de 2009

Depois do Trabalho

De luto. Não pela morte de alguém que, na verdade, não conheço. Fico de luto pelo fato de acreditar que a chuva parece atingir a todos. E eu que pensava que alguns esperavam ela passar. Sim, a chuva uma hora passa e a gente pode atravessar a rua sem molhar nossa roupa. Mas, pensando bem, é só uma roupa. O que está por baixo da mesma é a essência, certo? Errado.
Quanta petulância! Eu falando se algo está certo ou errado. Nesse momento, me pergunto quantas vezes já me molhei. Mas, claro, ninguém viu. E outra, foi consciente, foi pelo desejo de saber como é. Não, não como um cigarro que a gente acende olhando as fotos de cadáveres atrás do rótulo dourado. Não! A coisa é mais complexa. Eu é que não vou tratar isso como um comportamento. Vou tratar como uma coisa. Não me atrevo a colocar letra maiúscula. Eu, definitivamente, não quero debates sobre o porquê dessa birra na grafia.
Engraçado. Pulando os parágrafos aleatoriamente a gente se pergunta o que divide os capítulos das nossas horas. São tantas coisas que a gente para pra pensar e se perde, tanta coisa que se perde. É isso! A chuva se perde. Sempre fiquei pensando nas gotas que caem sobre o meu ombro. Uma hora, ela vai acabar se reunindo as outras que descem pelo bueiro, que consomem nossas narinas. É nisso que dá morar numa cidade que, por vezes, cheira a esgoto.
Como as gotas da chuva, aquelas pessoas que não esperam, se perdem. Eu não. Espero a chuva passar e, mesmo sem adiantar, procuro uma lógica nessa correria. O pai morreu? O horário da consulta começou a 10 minutos atrás? Ou será que conseguem sentir que o prédio vai desabar? O filho espera na companhia da babá. Se não chegarem a tempo, tudo desaba. Ao contrário da chuva que dilui no meio de tanta água, de tanta lama, de tanto mar; ao contrário da chuva, os escombros do prédio vão ficar a espera da retro escavadeira- e de espera, eles não sobrevivem.
Como os ônibus que parecem dispensar marcha ré, a vida dos automóveis coletivos que no lugar das rodas, usam sapatos Datelli, Sergio’s, ou mesmo Di Santini- afinal, classe média baixa também entra na história das avenidas largas (e como entra!)- parecem tentar marcar o chão. Marca infalível de uma prestação no cartão de crédito. Eu quero saber se todos esses indivíduos baterem as botas. Caramba, as Casas Bahia vão falir. E a chuva, a santa chuva que se infecta com o esgoto, como volta ao doce rio que insistimos em agredir?
E é mais engraçado ainda. Os ciclos. As dores. Sim, dói perceber o quão limpo são os dentes; porem, o quão sujo são os pés. Mas é assim mesmo; a boca, a gente fecha; os pés, a gente sufoca. Quando queremos parecer felizes, abrimos aquele sorriso! Os pés continuam sufocados. Porem, a noite, em casa, eles conseguem respirar. Sim, os ciclos, os parágrafos, a morte, o ônibus, os pés e, claro, a água.
Pensando bem, ainda bem que eles não ficaram do meu lado na hora da chuva.