segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Que decepção, Rodrigo. Tsc tsc tsc

Mudança de uso. Característica forte de um bairro que durante seu nascimento e crescimento— isso inclui o presente— foram implantados importantes equipamentos, como, por exemplo, o cemitério de Santo Amaro, Vilas Operárias e Fábricas; carrega não só no imaginário da população; mas também, no seu desenho físico, a forte presença de elementos industriais.

Na Rua da Aurora, na qual o contato com o Rio Capibaribe, traz não só a peculiaridade de uma das vistas mais arquetípicas do Recife; como também, condicionantes ambientais que pedem um olhar mais apurado. O projeto de um edifício residencial é sugerido.

O terreno localizado em um dos pontos mais fortes de uma possível arquitetura residencial verticalizada no bairro, compreende a esquina da já citada Rua da Aurora com a Avenida Mario Melo. Praticamente ao lado de quatro grandes projetos que conseguiram expressar seu zeitgeist, o desafio de projetar com um material que, apesar de não ser novo, quebra a cultura do concreto tão intrínseca no espaço, suscita alguns questionamentos.

A principal de uma série de dúvidas a respeito de como tratar a morfologia e tipologia da edificação, aliado aos necessários elementos que um mercado pede, o projeto proposto compreende apartamentos com divisões que possibilitem um espaço interno com 4 quartos, sendo um destinado a área de serviço. Uma segunda possibilidade pode ser atendida; quando todas as paredes, exceto as divisões do banheiro, desaparecem. As unidades que variam entre 105 e 140m² não perdem; mas sim, ganham um outro caráter que visa atender um publico que trabalha dentro de sua própria casa, considerando que Santo Amaro é berço de uma cena artística e cultural do Recife.

Além de estar situado em duas expressivas vias de deslocamento da cidade, o terreno possui uma de suas faces voltadas para uma travessa. A ruela que praticamente não possui calçada, poderá ser beneficiada com a doação de 1 metro do terreno. Criando assim um ponto a mais de visão— afinal, o muro é caracterizado pelo uso de grades; a travessa passa a ter um destaque maior.

A continuidade de um certo desenho observado nos edifícios Alfredo Bandeira, Capibaribe, Iemanjá e Montreal, que se projetam com suas marquises que cobrem a calçada, é quebrada com qualquer edifício construído com a legislação vigente. A troca público-privado que acontecia com os elementos de coberta (marquise) dos prédios já citados, pediria uma nova visão de um possível beneficio para o pedestre. Atento para a necessidade de visão constante dos pedestres para com o prédio e do prédio para com o pedestre, a utilização de muros constituídos com grades e equipamentos que tornem a calçada um ponto de encontro, é um fator que ajuda de forma não agressiva ao combate de uma violência urbana.

Os apartamentos possuem quartos e zonas de constante movimento em todas as faces que compreendam vista para as ruas do entorno. Apesar de sua forma dinâmica, não existem grandes mudanças na organização espacial dos apartamentos. A já tradicional sala integrada à cozinha e o uso de quartos sociais que aparecem concentrados em uma zona especifica da casa, só é quebrado pela disposição dos ambientes da sala em linha paralela a da varanda e um quarto de serviço que está situado numa face valorizada da edificação.

A decisão por varandas escalonadas surgiu ainda no inicio da concepção, com o intuito de aproveitar as diversas vistas que o terreno pode proporcionar, aliado a condição dos fortes ventos nessa área. Os pavimentos mais altos possuem varandas, mas as mesmas são recuadas e não sacadas, para uma melhor proteção contra os ventos e melhor utilização do espaço citado.

Com dimensão acima dos padrões hoje usados e utilizando painéis de brises; ou seja, criando uma dinâmica na percepção transeunte e maior conforto para o usuário, o conceito das varandas no espaço interno toma outro rumo e convida sem cerimônia para uma utilização que se confunde com outras áreas sociais da unidade. A proximidade com a cozinha é outro atrativo que assegura de uma vez por todas uma utilização justa com a finalidade do mesmo.

No trajeto que leva ao interior do edifício, o piso não corresponde ao principal traço do agenciamento. O que guia o acesso da entrada até a grande área aberta que se faz de recepção, são os elementos do teto. Os planos sobrepostos comunicam o caminho; mas também o desenho do corpo do edifico com seus traços e inclinações principais. A reunião de linhas que compõe o agenciamento podem ser observadas em mais uma área destinada a convivência dos condôminos, que se localiza entre o térreo e o primeiro pavimento.

Invertendo a ordem do mercado atuante, a área de lazer é citada por ultimo, mas satisfaz desejos contemporâneos sem, claro, cair no trivial. O salão de festas no ultimo pavimento, possui área de apoio, cozinha, banheiros e uma piscina que se perde literalmente ao lado da paisagem do entorno. A mesma foi criada com o intuito de possibilitar continuidade visual, dando a impressão da falta de peitoril em determinados locais; atraindo o olhar para a paisagem.

A busca por soluções contemporâneas, tendo como ponto de partida exemplos de outras épocas, possibilitou a compreensão de uma problemática atual e possíveis resoluções. A convivência de um bloco implantado no eixo cartesiano e outro não, brinda mais uma vez a vontade de inovar com a de se manter ligado a raízes incertas na paisagem urbana.


(Memorial descritivo do primeiro projeto da disciplina "Projeto de Arquitetura III"- Edifício Residencial em Estrutura Metálica)